Para fim de enquadramento como microempresa ou empresa de pequeno porte de acordo com os parâmetros de receita bruta definidos pelo art. 3º da LC 123/2006, considera-se o período de apuração das receitas auferidas pela empresa como sendo de janeiro a dezembro do ano-calendário anterior à licitação, e não os doze meses anteriores ao certame.
Em autos de representação, o TCU apreciou pedido de reexame interposto contra o Acórdão 2862/2018-Plenário, mantido em sede de embargos de declaração pelo Acórdão 124/2019-Plenário, na tentativa de reverter a decisão da instância a quo, que permitira a continuidade da execução do contrato decorrente do Pregão Eletrônico 6/2018, promovido pelo Comando Logístico do Exército (Colog).
O principal foco de discussão referiu-se à interpretação a ser dada à Lei Complementar 123/2006, especificamente no tocante ao enquadramento no tratamento diferenciado e favorecido dispensado às microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP). No caso concreto examinado, houve questionamento do resultado da licitação, uma vez que a empresa vencedora teria se beneficiado indevidamente do critério de desempate previsto na referida lei complementar em favor daquelas empresas, já que teria ultrapassado o limite de receita bruta para manter-se no respectivo enquadramento empresarial.
Em seu voto, o relator destacou que “relativamente à consideração da receita bruta, o tratamento da matéria nos termos que levaram ao acórdão 2.862/2018-Plenário partiu da premissa de que o ano-calendário poderia ser representado pelo período de doze meses imediatamente anteriores à licitação, e não pelo ano civil, de janeiro a dezembro”. Não obstante, assinalou que “a locução ‘ano-calendário’ referida com frequência na LC 123/2006 é notoriamente empregada no meio tributário como o ano fechado, de 1/1 a 31/12, que está sob determinado tipo de verificação. Assim faz a Receita Federal nos seus regulamentos, como o do Imposto de Renda, quando alude ao ‘ano-calendário’ como sendo o exercício anterior ao da exigência da declaração”. Desse modo, entendeu que “a manutenção da posição combatida iria de encontro à interpretação mais aderente à legislação e à que vem sendo inequivocamente utilizada, de que o ano-calendário abrange o período de 1/1 a 31/12”.
Voltando a atenção para o caso concreto, o relator examinou o faturamento da empresa vencedora do pregão, autodeclarada como EPP, e concluiu que ela não mais podia usufruir das vantagens da LC 123/2006 por ocasião do certame, por ter ultrapassado, no ano-calendário imediatamente anterior, o limite de receita bruta para se manter nesse enquadramento empresarial. Assim, configurada a fraude à licitação, o relator propôs, inicialmente, declarar a inidoneidade da empresa para participar de licitações na Administração Pública Federal por período de um ano.
Quanto ao contrato, considerou que eventual determinação para anulação do ajuste perdera o objeto, tendo em vista que já se encontrava encerrado. Em declaração de voto, o relator da deliberação recorrida, em que pese ter acatado o entendimento quanto à delimitação do ano-calendário, janeiro a dezembro, para avaliação da receita bruta, ponderou que a tese levantada pela empresa vencedora do certame, de que deveriam ser considerados os doze meses anteriores ao pregão para contabilização da receita bruta, não era desarrazoada, tendo sido, inclusive, acolhida pelo Tribunal quando do julgamento do acórdão recorrido, além de a própria unidade técnica, quando da instrução do recurso, ter destacado a plausibilidade da aludida tese.
Ao final, após ampla discussão acerca da dosimetria da pena, o relator propôs, e o Plenário acolheu, por unanimidade, dar provimento parcial ao recurso, a fim de tornar insubsistente o Acórdão 2862/2018 – Plenário e, entre outras medidas, declarar, com fulcro no art. 46 da Lei 8.443/1992, a inidoneidade da empresa vencedora do certame para participar, por seis meses, de licitações na Administração Pública Federal e, ainda, nos estados, Distrito Federal e municípios, caso envolvam recursos da União.
Acórdão 250/2021 Plenário, Pedido de Reexame, Relator Ministro-Substituto Weder de Oliveira.